A Portaria nº 983 do Ministério da Educação, de 18 de novembro de 2020 traz uma série de problemas em seus fundamentos.
Em relação à forma constitucional, conforme observado no parecer jurídico do Wagner Associados produzido a pedido do SINASEFE, a Portaria 983/2020: 1) extrapola as diretrizes complementares da lei 12.772/12, que regula a vida funcional do magistério federal até o ponto de reordená-la juridicamente ao dispor sobre especificidades; 2) fere o princípio constitucional de equidade no magistério federal implicando prejuízos insanáveis à carreira EBTT (Ensino Básico, Técnico e Tecnológico) e às instituições de ensino que agregam esses profissionais; 3) fere de direito e de fato a autonomia universitária didático-científica, administrativa, de gestão financeira e patrimonial e o princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, conforme o artigo 207 da Constituição Federal e do artigo 53 da LDB, lei 9.394/1996.
Em várias seções é comprometida a essencial autonomia universitária constitucionalmente prevista para fins de uma educação de excelência que seja inclusiva e socialmente referenciada na realidade social e, portanto, com indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. A Portaria ignora tanto discussões acumuladas junto ao CONIF (Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica) quanto, sobretudo, regulamentações de Conselhos Superiores das Instituições de Ensino Federal balizadas por Planos de Desenvolvimento Institucional próprios com Projeto Político Pedagógico (PPP) e Organização Didática conforme a complexidade dos desafios locais de cada uma.
No caso dos Institutos Federais, os mais afetados, compromete-se também uma perspectiva pedagógica institucional inovadora reconhecida mundialmente pelo seu desempenho de ponta no PISA, pela verticalidade que vai do técnico integrado ao médio até a graduação e a pós-graduação, desenvolvendo inovação tecnológica, articulando a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão nessa cadeia complexa e interiorizando esse modelo altamente exitoso em todo território nacional, tanto pelo número e distribuição geográfica dos seus campi, que variam de 10 a 37, quanto pelo alto impacto de inclusão social por todo território nacional, de qualificação sobre as redes estaduais de ensino e de potencialização dos arranjos sociais e produtivos efetivamente locais, conforme a vocação estabelecida na lei 11.892/2008 de criação destas instituições federais de educação profissional e tecnológica.
Quanto ao teor da Portaria 983/2020 e sua fundamentação, percebemos que além de sumariamente ignorar a discussão em curso dos entes competentes, como apontado acima, não explicita, muito menos justifica, teórica e praticamente o proposto, isso quando não faz escolhas altamente questionáveis ou mesmo rasas.
Destaca-se aqui dois sérios problemas que já justificariam por si a revogação da Portaria 983/2020. A conceituação de mediação pedagógica, normatizada com a devida competência legal pelo decreto 9057/2017 como ferramenta para Ensino a Distância (EaD), é acionada com equivocação legal e pedagógica pela Portaria 983, na seção “Dos Conceitos”, como atuação docente.
No mesmo sentido, e ainda mais grave, Pesquisa e Extensão são obrigatoriamente reduzidas a projetos ou ações curricularizadas nas seções “Dos Conceitos” e nas “Disposições Finais”, item 9, que diz categoricamente que deverão ser tratadas desta forma, o que inviabiliza flagrantemente a especificidade destas, base da indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão. Inviabilizando-se aqui, portanto, o próprio eixo central da experiência constitucional de autonomia universitária.
Acrescente-se o que segue em relação aos problemas incontornáveis encontrados seção após seção, e que justificam amplamente a revogação da Portaria 983. Na “Das Atividades Docentes”, o item 2.2 mensura essas em hora relógio desconsiderando sua natureza específica, o que compromete o bom desempenho destas.
Na “Das Atividades de Ensino”, metade dos tópicos são redundantes e a outra extrapola seu objeto focando em noções confusas e polêmicas sobre EAD, como o grave exemplo citado acima, sem balizá-las em nenhuma discussão prévia e avançando contra a autonomia universitária ao retirar do CONIF e das autarquias de ensino o regramento dessa modalidade de ensino.
Na “Das Atividades de Pesquisa”, o conteúdo ora redundante ora rebaixada em relação ao amplamente consolidado sobre o caráter da Pesquisa numa instituição de ensino com autonomia universitária, inclusive desconsiderando leis balizares como a 11.892/2008, sobretudo no artigo 6 da seção “Das Finalidades”, que cria os Institutos Federais, esse conteúdo da Portaria 983/2020 desconsidera sumariamente o caráter socialmente referenciado na produção de novos conhecimentos, inclusive chegando a sugerir no item 4.1 que parcerias envolvem apenas empresas e instituições.
Os mesmos problemas se encontram na seção “Das Atividades de Extensão”, reforçando a inviabilização de Pesquisa e Extensão apontada mais acima. Para fins de compreensão do alcance dessa inviabilização, que é do próprio projeto institucional das Instituições de Ensino Federal, acrescentemos o preciso apontamento do PDL 485/2020, que propõe a revogação da Portaria 983/2020, no sentido da inobservância da Meta 12.7 da lei 13.005/2014 e da Resolução 07/2018 do Conselho Nacional de Educação (CNE) para cursos de Graduação, e das exigências mínimas da CAPES nas avaliações regulares dos cursos de Pós-Graduação, podendo chegar no limite a inviabilizá-los.
Tal inviabilização se aprofunda e mesmo se consuma quando na seção “Da Carga Horária Docente”, item 7.2, a Portaria 983/2020 aumenta arbitrária e desarrazoadamente o quantitativo de aulas, desconsiderando, assim, a autonomia dos Conselhos Superiores para regularem as atividades docentes de forma isonômica e adequada à complexidade dos Planos de Desenvolvimento Institucional próprios criados, por sua vez, a partir de complexidades locais específicas.
Destaquemos ainda nesta seção o item 7.8 que inviabiliza de fato a constitucional autonomia administrativa ao restringir para além de sua competência a dispensa de aula apenas a reitores, pró-reitores, diretores-gerais e diretores de campus.
Por fim, destaquemos na seção do “Plano Individual de Trabalho e Relatório Individual de Atividades”, que o item 8.4 desconsidera tanto a isonomia do magistério federal quanto a natureza específica da atividade docente, sobretudo numa instituição de ensino pautada pela complexidade que sustenta uma autonomia universitária, mais uma vez inviabilizando sua completa realização.
Esperando que os argumentos acima, dentre outros pontos questionáveis, tenham demonstrado a impossibilidade de corrigir pontualmente a Portaria 983/2020, o que de resto se faz demonstrado por pareceres jurídico diversos e pelos PDLs 483, 484, 485 e 487 de 2020, solicitamos que seja sustado os seus efeitos como defende os PDLs citados.
CONTEÚDOS RELACIONADOS:
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