CARTA ABERTA À COMUNIDADE IFSP-ITP

 Nós, professores da Área do Núcleo Comum, em reunião realizada via plataforma Google Meet, nesta data, decidimos, coletivamente e por unanimidade, tornar pública a presente carta aberta a toda comunidade do IFSP, sobre a possível adesão do Câmpus Itapetininga ao programa da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP) denominado de NOVOTEC.

Em primeiro lugar, pensamos ser importante pontuar a diferença radical entre um processo democrático de consulta e uma consulta de foro privado. É comum se confundir essas coisas que têm pouco ou nada em comum. Ora, a democracia, já ensinavam os gregos, é algo que se faz na praça pública, onde todos estão visíveis. Que se entenda bem: visíveis se tornam os diversos posicionamentos manifestados de forma pública numa praça. Mesmo quando se recorre ao voto secreto, ele só se realiza após prévio debate, a fim de que todos estejam esclarecidos e seguros de seus posicionamentos. Coisa completamente diferente é se perguntar para o indivíduo isolado (e escondido em sua privacidade) por e-mail em prazo estreito e sem prévio debate o que ele pensa a respeito de algo que não se debateu publicamente. Quem garante que ele estivesse esclarecido e seguro de sua posição ao responder um formulário em sua casa? É importante frisar este ponto, para que não sejamos surpreendidos novamente com consulta privada a respeito de temas de interesse institucional. Esse é um processo que pode ter ares de democrático, porque todos foram consultados, mas, no seu profundo, é essencialmente anti-democrático. Por isso, sugerimos a realização de uma assembleia geral do Câmpus para discutir a matéria.

Nós levantamos conjuntamente os seguintes questionamentos:

1)  Se são previsíveis os impactos no trabalho docente, técnico-administrativo e dos terceirizados: na infraestrutura do Campus; no material necessário para realização das atividades de aula; e no âmbito das próprias políticas educacionais do IFSP, em especial, da educação básica, não seria o caso de se alterar o PDI do Câmpus? Segundo o material enviado em anexo ao e-mail e à pesquisa, os alunos da rede estadual serão considerados alunos do IFSP, ou seja, estarão sendo criados novos cursos dentro da instituição. Isto posto, perguntamos: a comissão do PDI do Câmpus foi consultada? O PDI do Campus será revisado?

2) De qual instância da Instituição partiu a solicitação de tal consulta? Quais interesses institucionais, educacionais e políticos envolvem a adesão ou não ao programa? Qual a posição dos colegiados do IFSP em relação a essa parceria? A adesão institucional ao NOVOTEC foi aprovada pelo Consup e pelo Conen? Não estamos ferindo a unidade institucional e a lei de criação dos Institutos ao reduzirmos esse debate ao “desejo do Câmpus”?

3) Em qual momento teremos acesso a maiores detalhes sobre a parceria entre o IFSP e a FAI • UFSCar, entidade de direito privado, sem fins lucrativos, com personalidade jurídica própria? O que nos leva às seguintes indagações:

a) Seria este o momento oportuno para discutirmos a adesão, ou não, a um programa de natureza aparentemente contrária ao espírito politécnico dos Institutos Federais, que demandará, entre outros elementos, maior esforço de trabalho dos servidores? Isto é, como dissociar essa discussão da regulamentação da portaria 983/20 do MEC que amplia a carga horária docente dedicada à docência?

b) Essas oito horas semanais poderão ser indicadas no PIT do docente? Isto é, elas contam como trabalho do docente para a instituição? Se sim, novamente seria preciso pensar numa revisão do PDI. E mais, como se justifica a gratificação extra por um trabalho para o qual já somos remunerados? Se não entra na carga de trabalho semanal, se é “um trabalho extra” como se explica que docentes com dedicação exclusiva tenham uma segunda fonte de renda com a própria instituição para a qual deveriam se dedicar com exclusividade? Ambas as situações beiram o absurdo jurídico, não? (obs: perceba-se como uma consulta privada sem debate prévio, na qual se oferece uma gratificação de R$ 3.200,00 mensais extra para o consultado pode perverter o resultado da consulta).

4) Com a adesão ao NOVOTEC passamos a poder contar com diferentes formas de contratação de profissionais, que trabalhariam no curso a partir de outros critérios de seleção que não o concurso público. Qual é o impacto destes diferentes contratos de trabalho em uma instituição formadora e de qualidade como a nossa?

5) Outras questões importantes nos parecem ser, por exemplo, a contrapartida da SEE/SP, o papel do IFSP nesta “parceria” e novo rearranjo da educação profissional apresentado pelo NOVOTEC que parece se contrapor profundamente à função social do IFSP na sociedade. Todas essas questões não precisam ser discutidas pelos colegiados dos IFSP?

6) Por que, em vez de investir em cursos em parceria com o Estado de São Paulo, num claro movimento de adesão ao Novo Ensino Médio, o Câmpus não se dedica à abertura de novos cursos Integrados? Tal possibilidade não estaria aberta em decorrência da revisão dos PPCs dos cursos, motivada pela publicação dos Currículos de Referência? Os Integrados não são notadamente cursos com baixa evasão e alta demanda social? Não seriam os Integrados cursos mais fiéis à identidade dos Institutos Federais?

7) Ademais, no material enviado em anexo ao e-mail e à pesquisa, diversos cursos técnicos profissionalizantes são propostos, porém, não houve sequer uma discussão mais ampla com a comunidade interna e externa a respeito da demanda e do alcance que esses cursos realmente teriam, junto aos estudantes, considerando sua realidade social e Não seria o caso de fazê-lo?

Entendemos que são questões que deveriam ser respondidas institucionalmente, num primeiro momento, pois são demandas mais importantes para nosso Câmpus.

Consideramos, ainda, que as mudanças referentes às políticas públicas sobre a Educação, iniciadas com a Reforma do Ensino Médio (nº 13.415/2017) e a tentativa de extensão desse modelo para os cursos técnicos dos Institutos Federais, via NOVOTEC, são ataques diretos aos princípios fundamentais da politecnia, do ensino integrado e da educação pública socialmente referenciada. Tais ataques colocam em risco não somente a qualidade da nossa Educação Básica, como poderão potencializar a precarização do trabalho docente que já está sobrecarregado e que tendem a aumentar com a possível entrada em vigor da portaria 983/2020.

Isso posto, pedimos que os resultados dessa pesquisa não sejam divulgados ou tramitados para instância superior antes de devidamente debatidos com a comunidade.

Itapetininga, 17 de maio de 2021.

 

Assinam essa carta os servidores abaixo:

Ana Paula Rodrigues de Melo – Arte

Cláudio Ferraz Zioli – História

Fabiana Zilocchi Marcondes – Língua Portuguesa/Inglês

Gabriela Cristina Monteiro de Moura – Língua Portuguesa/Espanhol

Jéssica Felix Nicacio Martinez – Educação Física

Jonny Nelson Teixeira – Física e Ensino de Física

Juliano Ricciardi Floriano Silva – Geografia Marcos

Antonino Callegari – Química

Marisa Sormani Bastos – Marques – Inglês

Paula Garcia Meirelles Grassi –

Biologia Rafael Barberino – Filosofia

Regiani Zornetta – Sociologia