ACESSE AQUI O DOCUMENTO EM FORMATO PDF: CARTA ABERTA À REITORIA DO IFSP

Magnífico Reitor do Instituto Federal de São Paulo,

Nós, membros da COMPARECE (Comissão de Planejamento e Análise Estratégica no período de Calamidade e Excepcionalidade) abaixo assinados manifestamos posicionamento público sobre a Portaria IFSP N° 2337, de 26 de junho de 2020, e do processo que levou sua produção. Nesta carta, buscamos mais uma tentativa de diálogo sobre os graves problemas que essa Portaria representa. Os argumentos aqui expostos foram amplamente ressaltados nas reuniões da COMPARECE – inclusive através de documentos – no entanto, não foram levados em consideração. Em nome da concisão do presente texto, apresentaremos apenas a questão que avaliamos central, de maior gravidade e consequência negativa, a saber: a Portaria institucionaliza e legitima o processo de exclusão, sendo, por isso, discriminatória.

Em seu artigo 8°, a Portaria estabelece:

“Art. 8° Os estudantes, ou seus responsáveis legais quando menores de idade, que verificarem não possuir condições de acompanhar a forma de Reorganização do Calendário Acadêmico proposta pelo câmpus não poderão ser prejudicados, terão seus direitos preservados e poderão:
I. Realizar o cancelamento de disciplinas, para os cursos de graduação;
II. Realizar a solicitação do Extraordinário Aproveitamento de Estudos, para os cursos de graduação, nos termos desta Portaria;
Ill. Realizar a solicitação do Reconhecimento de Saberes e Competências, para os cursos da Educação Profissional Técnica de nível médio, nos termos desta Portaria;
IV. Realizar o trancamento compulsório da matrícula, mesmo que esteja no primeiro período letivo, para todos os cursos, sem que este período seja contabilizado no prazo para integralização; “

Ao prever mecanismos para supostamente preservar os direitos daqueles estudantes que não tiverem condições de acompanhar a reorganização proposta pelos Campi, ou seja, os incisos os I, II, III e IV do Art. 8º, a Portaria explicitamente viola os direitos educacionais destes estudantes.

É importante ressaltar que o trancamento de matrícula para estudantes menores de idade afronta diretamente a legislação, que prevê a obrigatoriedade da matrícula de crianças e adolescentes na Educação Básica. O responsável por um adolescente que solicitar o trancamento da matrícula de seu filho pode ser denunciado por negligência. O que dizer da escola que oferece essa possibilidade ao estudante como forma de “preservar seus direitos”?

Tudo indica que, mesmo considerando o momento atípico e excepcional que vivenciamos, o referido artigo fere o inciso I do Art. 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 9394, de dezembro de 1996, onde está previsto que o ensino será ministrado com base no princípio da “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”.

Destacamos também que o trancamento de matrícula acarreta no rompimento temporário do vínculo com a instituição, implicando a perda imediata de qualquer bolsa ou auxílio que o estudante receba, justamente no momento que o jovem mais precisa destes recursos. Dessa forma, a Portaria coloca os estudantes que não têm condições de acompanhar as atividades propostas frente ao seguinte dilema: trancar a matrícula e perder auxílios eventualmente essenciais para a própria sobrevivência (sob o risco de denúncia, no caso de responsáveis por menores de idade) ou não trancá-la e arcar com a consequência da reprovação por faltas ao não cumprir os deveres escolares.

Os membros da COMPARECE ofereceram uma série de sugestões para sanar este problema, que foram, infelizmente, ignoradas. Em seu artigo 2°, a Portaria procura legitimar seu próprio processo de produção, induzindo o entendimento que ela é resultante das discussões realizadas na COMPARECE. Não é verdade. A COMPARECE sequer teve acesso ao texto final da Minuta, a única atitude que estava ao alcance dos membros da Comissão foi a possibilidade de colocar “sugestões”, que não foram acatadas sem qualquer justificativa ou, muito menos, passaram por algum processo de sufrágio.

Isso não seria necessariamente um problema, se a Minuta fosse, depois, apreciada pelo órgão deliberativo máximo da instituição: o CONSUP (Conselho Superior). Consideramos a COMPARECE como uma Comissão importante neste momento extraordinário, como um mecanismo institucional para ampliar o debate a respeito de medidas que afetam drasticamente a vida de todos nós, permitindo uma ampliação democrática muito bem-vinda. No entanto, se a Comissão é utilizada para eludir a necessidade de tais medidas serem analisadas e aprovadas pelos órgãos que estruturam a gestão democrática da instituição, ela deixa de ser um mecanismo da ampliação democrática, para tornar-se um mecanismo para a encenação de uma ficção democrática ou, até mesmo, de uma farsa democrática. Como membros desta comissão, não podemos compactuar com este processo e nos vemos na obrigação de denunciá-lo.

Acreditamos que os problemas apontados, entre outros não apontados neste texto, são solúveis. A Reitoria do IFSP tem condições de reverter seu gesto arbitrário e excludente de publicação da Portaria 2337, submetendo o texto à análise do CONSUP (e, se desejar, da própria COMPARECE). Ao fazer isso, será possível um processo participativo e democrático para deliberar a respeito de uma forma de organização,neste período de excepcionalidade. Se, entretanto, a Reitoria preferir insistir em seu gesto autoritário e discriminatório, que o faça apenas em seu próprio nome e não instrumentalizando os membros da COMPARECE.

Sincera e respeitosamente,

Elizangela Maria Esteves de Barros (Representante TAE – CONSUP)
Whisner Fraga Mamede (Representante Docente – CONSUP)
Cleber Fernandes Nogueira (Representante TAE – CONEN)
Leonardo Crochik (Representante Docente – CONEN)
Gabriel Terra Pereira (Representante Docente – CONEX)
Biana Politto de Sá (Representante Discente – CONSUP)
Jean Douglas Zeferino Rodrigues (Representante Docente – SINASEFE-SP)
Márcia Teani (Representante Docente – SINASEFE-SP)
Maíra Martins (Representante TAE – CIS)